«Deixe-me resumir, Teodoro, a morte desse velho Mandarim idiota traz-lhe à algibeira alguns milhares de contos. Pode desde esse momento dar pontapés nos poderes públicos: medite na intensidade deste gozo! É desde logo citado nos jornais: reveja-se nesse máximo da glória humana! E agora note: é só agarrar a campainha, e fazer ti-li-tim. Eu não sou um bárbaro: compreendo a repugnância de um gentleman em assassinar um contemporâneo: o espirrar do sangue suja vergonhosamente os punhos, e é repulsivo o agonizar de um corpo humano. Mas aqui nenhum desses espectáculos torpes... É como quem chama um criado... E são cento e cindo ou cento e seis mil contos; não me lembro, mas tenho-o nos meus apontamentos... O Teodoro não duvida de mim. Sou um cavalheiro: provei-o quando, fazendo a guerra a um tirano na primeira insurreição da justiça, me vi precipitado de alturas que nem Vossa Senhoria concebe... Um trambolhão considerável, meu caro senhor! Grandes desgostos! O que me consola é que o OUTRO está também muito abalado: porque, meu amigo, quando um Jeová tem apenas contra si um Satanás, tira-se bem de dificuldades mandando carregar mais uma legião de arcanjos; mas quando o inimigo é um homem, armado de uma pena de pato e de um caderno de papel branco - está perdido.. Enfim, são cento e seis mil contos. Vamos, Teodoro, aí tem a campainha, seja um homem.»
(in O Mandarim, 1880)
sábado, 5 de outubro de 2013
domingo, 29 de setembro de 2013
A PERFEIÇÃO
«Calipso segurou de leve o
seu ombro robusto:
-Quantos males te esperam, oh desgraçado! Antes ficasses para toda a imortalidade na minha ilha perfeita, entre os meus braços perfeitos...
Ulisses recuou, com um brado magnífico:
- Oh Deusa, o irreparável e supremo mal está na tua perfeição!
E, através da vaga, fugiu, trepou sofregamente à jangada, soltou a vela, fendeu o mar, partiu para os trabalhos, para as tormentas, para as misérias - para a delícia das coisas imperfeitas!»
-Quantos males te esperam, oh desgraçado! Antes ficasses para toda a imortalidade na minha ilha perfeita, entre os meus braços perfeitos...
Ulisses recuou, com um brado magnífico:
- Oh Deusa, o irreparável e supremo mal está na tua perfeição!
E, através da vaga, fugiu, trepou sofregamente à jangada, soltou a vela, fendeu o mar, partiu para os trabalhos, para as tormentas, para as misérias - para a delícia das coisas imperfeitas!»
(«A Perfeição», 1897 in Contos)
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